Por mais anos que passem, há memórias que jamais esquecemos, sejam de pessoas,
locais cheiros ou sons. Apesar de terem passado mais de trinta anos que não revisito
esse local, o Vale do Boi situado numa garganta do nosso rio entre a Quinta e a Pedrosa,
é um local idílico e bucólico não só pelo verde que irradia dos seus lameiros, mas
também dos amieiros e dos freixos que ladeiam o rio, dando a este local um ambiente
idílico e bucólico convidando ao recolhimento e à meditação.
Na primavera então, este local é um esplendor. O cheiro característico da erva verde,
em junção com outros aromas como, o da flor do sabugueiro e do rosmaninho,
assim como o murmúrio da água do rio a cair em cachão nas represas que desviam a
água para os lameiros, juntamente com o canto das variadíssimas espécies de
pássaros desse habitat (rouxinóis, melros, pica-paus, rolas, pintassilgos) tornam
este local num permanente concerto celestial.
A norte dos lameiros, ergue-se em forma de anfiteatro um monte, assim em dias de
vento norte, ouve-se o som do vento nas ramagens dos pinheiros sentindo-se
em baixo uma soalheira, convidando ao relaxe e a uma boa soneca.
Pena que a estadia neste local, estava sempre associado a uma tarefa, a guardar as vacas
na maioria das vezes, por isso o dormir era proibido. Valiam algumas as brincadeiras
com os outros jovens vizinhos de outros lameiros, ou a leitura de livros que
mensalmente se requisitavam na biblioteca itinerante da Gulbenkian.
Todos os anos, quando regresso a Outeiro Seco, eu prometo visitar o Vale do Boi,
mas infelizmente outros afazeres se sobrepõem e a visita vai ficando adiada.
Oxalá este ano eu possa ir ao Vale do Boi e sentir os mesmos aromas e sons que
perduram no meu imaginário.
De Lisboa com saudade
Nuno Santos